sexta-feira, 23 de abril de 2010

Pais e Filhos: onde tudo começa

Certamente se poderia elencar um grande número de atribuições dos pais em relação à criação dos filhos, mas, no meu entendimento, TUDO se resume a uma questão básica: ensinar os filhos a distinguir o “certo” e o “errado”, mostrando-lhes as consequências decorrentes das decisões que possam tomar, das escolhas que possam fazer.  Esta não é uma missão fácil e penso que ela se torna ainda mais difícil, em face de alguns problemas relacionados à “criação moderna”, representados por posturas desprovidas de bom sendo, que alimentam a inversão de valores e a hipocrisia, como por exemplo:

a) PAIS NÃO QUEREM QUE FILHOS PASSEM PELAS MESMAS DIFICULDADES QUE PASSARAM (OU QUE JULGAM TER PASSADO)
:
É cada vez mais enfatizado que o uso da palavra “não”, o castigo e a palmada traumatizam a criança. A infância e a adolescência dos pais apresentaram momentos de contrariedades e de repressão. Algumas recordações dos pais não são agradáveis e também seria desagradável submeter os filhos às mesmas situações. Estas questões são exploradas através de uma vasta literatura e frequentemente são focos de reportagens nos meios de comunicação. Entendo que há uma pregação da liberdade total: fazer o que se quer e pronto. É permitido à criança e ao pré-adolescente: pichar as paredes do próprio quarto de dormir (tenho pra mim que é daí que nascem os pichadores de prédios e monumentos); navegar à vontade na Internet, ficando a mercê dos perigos a ela inerentes; andar por onde sua família não sabe, com quem sua família desconhece; arranjar desculpas e mais desculpas para não se esmerar nos estudos e assim por diante. Estes conceitos são disseminados de forma tão intensa, que, em um dia destes, navegando pelo Facebook, eu me deparei com o seguinte texto:


“Respire. Você será mãe por toda a vida.
Ensine as coisas importantes. As de verdade.
A pular poças de água, a observar os bichinhos,
a dar beijos de borboleta e abraços bem fortes.
Não se esqueça destes abraços e não os negue nunca.
Pode ser que daqui a alguns anos, os abraços
que você sinta falta sejam aqueles que você não deu.
Diga ao seu filho o quanto você... o ama, sempre que pensar nisso.
Deixe ele imaginar. Imagine com ele.
AS PAREDES PODEM SER PINTADAS DE NOVO,
AS COISAS QUEBRAM E SÃO SUBSTITUÍDAS.
OS GRITOS DA MÃE DOEM PARA SEMPRE.
Você pode lavar os pratos mais tarde.
Enquanto você limpa, ele cresce.
Ele não precisa de tantos brinquedos.
Trabalhe menos e ame mais. E, acima de tudo, respire.
Você será mãe por toda a vida.
Ele será criança só uma vez.”

Em  minha opinião, este texto seria maravilhoso não fossem os seguintes aspectos decorrentes das frases que, propositadamente, coloquei em maiúsculas:
- Então a criança pode tudo?
- Educar um filho é isto?
- Ao riscar paredes da sua casa a criança experimenta algo novo, que aguça sua criatividade, que lhe deixa feliz, que vai contribuir com o seu amadurecimento?
- Evoluindo nesta experiência, ela também poderia riscar os móveis, o carro do seu pai? Haveria ou não a mesma permissividade? Em não havendo a mesma permissividade, qual seria a argumentação COERENTE, VÁLIDA para dissuadir a criança deste desejo?
- E se, ao contrário de tudo isto, a criança fosse ensinada a agir corretamente, ou seja, a riscar folhas de cartolina, de caderno? Isto lhe causaria as mesmas sensações?
- Riscando as paredes e quebrando objetos a criança demonstra respeito por seus pais? Ela demonstra que valoriza os esforços dos seus pais?
- Quando adulto esta pessoa terá respeito por suas coisas e pelas coisas dos outros?
Ela respeitará o patrimônio público?
- E quanto aos gritos da mãe? Mesmo sabendo-se que o grito não é uma forma adequada de se tratar um ser humano, ainda mais se criança ou pré-adolescente, será que, de fato, ele dói para sempre? A percepção, num dado momento da vida, de que um caminho errado foi trilhado, um caminho de frustrações, sem conquistas, não doeria muito mais do que os gritos da mãe?

b) FAZER VISTAS GROSSAS PARA EVITAR O ESTRESSE DO CONFRONTO
É mais fácil fazer vistas grossas às malcriações das crianças e dos adolescentes do que se estressar para mostrar a elas(es) o quanto estão erradas(os) num dado momento. É mais cômodo. Já há muito estresse com outras questões (problemas no trabalho, problemas financeiros, relação conjugal, discórdias familiares, etc) e não há espaço para mais estresse. Por outro lado, uma grande quantidade de pessoas que constitui família não se apercebe ou demora demais para perceber que colocar um filho no Mundo requer, acima de tudo, muita responsabilidade, muito comprometimento, ou seja, "maturidade";

c) NÃO VALORIZAR AS EXPERIÊNCIAS JÁ VIVIDAS
Muitos adultos não se valorizam. Não valorizam a experiência de vida que acumulam (que é absurdamente maior do que aquela que uma criança ou um adolescente tem) e, portanto, não fazem questão de transmiti-la. Afinal, os tempos mudaram, os conceitos mudaram, a forma de aprendizado mudou. Além do mais, para obter experiência, via de regra os adultos tiveram que "bater com a cabeça na parede" muitas vezes, até aprenderem. Desta forma, eles acreditam que as crianças e, principalmente, os jovens também devem percorrer este mesmo caminho, passar por esta mesma experiência.



Eu acredito que das afirmações acima e de outras que também poderiam ter sido elencadas, somente a da letra "b" expressa a realidade da grande maioria dos pais que se mostram irresponsáveis em relação à criação dos seus filhos. Faço esta afirmação com base no fato de que, no meu entendimento, todas as situações levam a uma só, pois todas, excetuando-se aquela elencada na letra "b", representam meras desculpas. O verdadeiro problema reside na comodidade, no ato de evitar "bater de frente", no receio de se desgastar, de se incomodar.
A partir do nascimento, vamos aprendendo a conhecer uma nova realidade, que nos afetará, sobremaneira, em todos os sentidos. Lentamente, despertamos para a vida, que nos apresenta tudo de bom e de ruim que possui. Sofremos a influência de tudo que nos cerca. Mas os pais, verdadeiramente educadores, deveriam estar atentos, para aparar uma ou outra aresta que possa causar nos filhos uma deformação qualquer de conduta. Mas, será que os pais estão atentos?
A partir do nascimento do primeiro filho ou do único filho, os pais tem sua responsabilidade significativamente aumentada, pois passam a ser educadores. Aí já não é mais possível pensar somente em si. Não há mais espaço para egocentrismo. Tudo começa a girar em torno dos filhos. Aqueles que não levam a sério a maternidade e/ou a paternidade, que, infelizmente, representam a grande maioria dos casais dos tempos ditos modernos, não conseguem ter esta responsabilidade para com os filhos. Para eles, ter um filho é o mesmo que ter uma casa ou um carro. Assim como, vez ou outra, fazem uma pintura na casa ou uma revisão no carro, compram uma roupa nova para o filho ou levam-no ao médico ou ... Esquecem, completamente, que tem o importantíssimo papel de educadores e que, hoje, deixar o(a) filho(a) “aprender com a vida” significa deixa-lo(a) a mercê das influências negativas das más companhias, das drogas, do crime. Tem, ainda, aqueles pais, não menos irresponsáveis em relação à criação dos seus filhos, que, fingindo para si próprios uma demasiada preocupação com o alto grau da concorrência predatória que nos cerca, impingem em seus filhos um comportamento adulto precoce. Aliás, sobre isto Roberto Shinyashiki comenta o seguinte em sua palestra intitulada
CUIDADO COM OS BURROS MOTIVADOS:
"O pai quer preparar o filho para o futuro e mete o menino em aulas de inglês, informática e mandarim.
Aos nove ou dez anos a depressão aparece.
A única coisa que prepara a criança para o futuro é ela poder ser criança.
Com a desculpa de prepará-los para o futuro, os malucos dos pais estão roubando a infância dos filhos.
Essas crianças serão adultos inseguros e terão discursos hipócritas."
Tenho para mim que estes pais querem reduzir dramaticamente o tempo de infância e de adolescência dos seus filhos, para se incomodarem menos nestas fases e, simultaneamente, garantirem o aumento da renda familiar futura. O filho é visto como um investimento lucrativo. Mais tarde a maioria destes pais chora, se desespera, blasfema contra o Criador (sim, pois Ele é o culpado de tudo). Procura ajuda, mas aí, muitas das vezes já é tarde, pois o mal está feito. O filho está perdido.
A Gazeta do Povo (Curitiba) publicou, em 10/11/2013, uma entrevista sob o título MÃE TEM QUE SER BRUXA, feita com a psicanalista, professora e pós-doutora em Psicologia Clínica, sra. Márcia Neder, que, discorrendo sobre as transformações ocorridas com as famílias nas últimas décadas e aí enfatizando as novas formações familiares (família homoafetiva e família monoparental), bem como a mudança comportamental dos pais (abandono da posição de adultos da relação e consequente perda de poder), afirma que "nossa cultura deslocou o poder, culminando com o que eu chamo de déspota mirim, ou seja, uma cultura centrada na criança". Na verdade, lendo aquela publicação, conclui-se que o adulto não tem se posicionado como tal junto a criança. Tem, sim, desejado ser como o coleguinha, o amiguinho do seu filho, que é quem passa a estar no centro do poder. Não se comportando como adultos, os pais substituem a busca da obediência e do respeito pela busca da aprovação. Neste contexto O MENOR ENFRENTAMENTO/DESGASTE DE HOJE SERÁ, SEM SOMBRA DE DÚVIDA, O MAIOR PROBLEMA QUE OS PAIS TERÃO AMANHÃ, EM RELAÇÃO AOS SEUS FILHOS, PROVAVELMENTE PARA O RESTO DE SUAS VIDAS.


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